22.4.06

Um dos raros prazeres de se andar de ônibus é poder presenciar um senhor engravatado, sentado ao lado, cantar em irretocável falsete:

"First I was afraid
I was petrified
Kept thinking I could never live
without you by my side"


16.4.06

Olha, Marta!
O livro que você me deu quando fizemos um ano de namoro. Nossa, como faz tempo...

Você se lembra de como a gente se conheceu? Foi naquele baile de carnaval do clube: todo mundo bêbado, um calor infernal e eu lá num canto fumando, olhando pro teto. Acho que você foi a única alma viva que me notou; chegou de mansinho, pediu fogo e foi logo se acomodando na cadeira ao lado - você sempre foi muito assim!

E do que a gente falou, hein?
Hm, também não consigo recordar. Ah, mas deve ter sido bobagem. Nessas horas só se fala bobagem! Mas foi aí que eu, muito esperto, consegui seu telefone - e nunca mais pude tirar seus olhinhos tortos da minha cabeça...

Que besteira, Marta! Não te chamei de vesga! Você bem sabe que seus olhos sempre foram um charme. Não, veja bem, uma coisa é...Ai, meu Deus, vamos começar de novo?

Está bem, está bem, então, chega. Eu já estava indo embora, peguei tudo que tinha de pegar, o que era meu. Se acaso ficar alguma coisa para trás, você mande pelo Zequinho, ok?
Ah, e esse livro, bem, pode ficar pra você - eu nunca gostei mesmo de García Lorca.


11.4.06

Quando dei por mim, já sentia em meu lábio escorrer a saliva, lenta e parabólica, cortando a realidade e me trazendo à tona do torpor que aquele corpo me mergulhara. Mãos por toda a parte, eu sentia calafrios, e a respiração quente e ofegante sobre mim, a branca pele a ruborescer, só fazia aumentar minha sensação de incômodo repentino.

Tentava olhar ao meu redor, mas a teia de cabelos loiros me cercava e o perfume a brotar do pescoço curvo fracionava toda a sorte de movimento. Eu era um prisioneiro nas mãos inimigas e não podia entender como as coisas haviam chegado a tal ponto. Já poderia até prever os comentários, os olhares, as especulações alheias sobre tudo o que se passava - existir subsequentemente mostraria-se absolutamente inquietante.

Em pernas petrificadas, hesitante nos pensamentos, entregava-me ao peso de, ainda com 10 anos, enfim perder a guerra.


2.4.06

Ok, estou mais tranqüilo.
A nave com o primeiro astronauta brasileiro não explodiu.

Não é uma questão de entrar no mérito da validade do projeto, dos gastos, das consequências etc, mas é que brasileiro é um tremendo azarado - e começar o ano com um fiasco internacional seria, no mínimo, sintoma de zica o ano inteiro.

É sempre bom lembrar que estamos em ano de Copa do Mundo e eleições, sempre bom! Cruz credo...